Neste artigo, a psicanalista Andréa Ladislau fala da importância do diálogo e empatia para valorizara a vida
Neste mês de setembro, temos a campanha do Setembro Amarelo que é voltada para a prevenção do suicídio. Muito se fala sobre o suicídio, mas quais as implicações? De que forma podemos ajudar um suicida em potencial? Como perceber atitudes que podem culminar nesta tragédia? Qual a faixa etária e gêneros mais afetados?
Vamos aos fatos e cuidados que podemos ter, mas deixando claro que, a prevenção do suicídio deve ser feita ao longo de todo o ano. Não é só no mês da campanha que devemos nos preocupar. Nosso olhar deve estar voltado para qualquer sintoma característico em relação a quem possa vir a cometer o ato. Sabemos que, no Brasil, a taxa de crescimento de casos de suicídio na faixa etária de 10 a 14 anos aumentou 40% em dez anos e 33,5% entre adolescentes de 15 a 19 anos. Em média, dois adolescentes tiram a própria vida por dia, segundo pesquisas. Mas em geral, o suicídio pode afetar qualquer pessoa e nossos adultos estão também entre os maiores candidatos, atingindo um percentual em torno de 48% na faixa etária de 35 a 55 anos.
Já a mortalidade masculina foi superior a 2,7 suicídios masculinos para cada suicídio feminino. Entre os homens, os meios mais utilizados são o enforcamento (36,4%) e as armas de fogo (31,8%). Entre as mulheres predomina o envenenamento (24,2%), seguido pelas armas de fogo e enforcamento (21,2% cada). Onde a principal causa de morte por suicídio no mundo é a depressão.
Em algum momento de nossas vidas, pode ser que desconfiemos de que alguém próximo está pensando em suicidar-se em decorrência de um grande sofrimento. Diante dessa situação, o sentimento de impotência pode se fazer presente, fazendo-nos acreditar que não há como intervir, uma vez que a pessoa parece já ter decidido encerrar a própria vida. Entretanto, ao contrário do que o senso comum tende a reproduzir, existem diversas maneiras de auxiliar essa pessoa.
A importância do diálogo e da escuta
Converse diretamente com quem está sofrendo. Um diálogo aberto, respeitoso, empático e compreensivo pode fazer a diferença. Procure saber como a pessoa está, o que tem feito ultimamente, como está se sentindo. O foco da conversa deve ser o outro, portanto, não é recomendável: falar muito sobre si mesmo, oferecer soluções simples para os problemas que a pessoa relatar e desmerecer o que ela sente.
Essa conversa pode obter melhores resultados se for feita em um lugar tranquilo, sem pressa, respeitando o tempo da pessoa para se abrir. Caso a pessoa se sinta à vontade para compartilhar o seu sofrimento, não é indicado: rechaçar (“Credo, isso é pecado!”), esboçar expressões de choque (“Não acredito que você tá pensando nisso!”) e reprimir, caso o choro venha (“Pra que chorar? Você sempre teve tudo do bom e do melhor!”). É muito importante, deixar que a pessoa chore. O choro fará com que possa vir o sentimento de alívio e a sensação de esvaziamento da angústia do peito.
A escuta ativa deve sempre estar presente nesses diálogos. Ela consiste em realmente ouvir e compreender o que o outro diz, não apenas esperar uma pausa para poder respondê-lo. Isso não significa, no entanto, deixar a pessoa falando sozinha. Algumas pontuações que podem ser feitas consistem em: fazer perguntas abertas; fazer um breve resumo do que a pessoa falou, de tempos em tempos, para que ela saiba que você está atento ao que ela diz; retornar a algum ponto que não tenha ficado claro e tentar, ao máximo, escutá-la sem julgamentos.
Oferecer suporte emocional e informar sobre a ajuda profissional, bem como se mostrar à disposição, caso ela queira conversar novamente, são pontos importantes. Se a pessoa falar de forma aberta sobre os seus planos de se matar e parecer estar decidida quanto a isso, é primordial que ela não seja deixada sozinha. Se você perceber que ela não se sente à vontade para se abrir, deixe claro que você estará disponível para conversar em outras oportunidades.
Existem infinitos motivos para um ser humano estar desesperançado o suficiente a ponto de querer acabar com a própria vida; em geral, pode ser por luto, depressão, transtorno de ansiedade, outras questões mentais, violência sexual, abuso durante a infância, fim de relacionamento, bipolaridade, bulling…
Empatia, funciona muito nestas horas. Ouça empaticamente. Tente se colocar no lugar da pessoa A dor não faz qualquer distinção. Todos podem ser acometidos por esse sentimento, independentemente de idade, ideologias, gênero, orientação sexual, nacionalidade, classe social e etnia. E quando essa sensação de desespero, desamparo, é profunda demais, a ponto de não ser suportada, os pensamentos suicidas ganham força. Esse fardo é tão pesado que pode fazer com que a pessoa acredite que o suicídio seja a única maneira de se livrar dos problemas, julgando-se incapaz de suportá-lo e enxergando a vida como algo sem significado.
Alguém que tenha ideias suicidas deixa “pistas” de que anda passando por um delicado momento emocional. Contudo, é importante pontuar que os sinais variam de acordo com a personalidade do indivíduo. Um indivíduo fragilizado pela depressão ou qualquer outro problema emocional tem dificuldades para lidar com uma demissão, fim de um namoro (ou casamento) ou perda de um ente querido, por exemplo.
É comum que ele deixe de frequentar os lugares que costumava ir, abra mão de seus hobbies e perca o interesse em qualquer atividade que lhe dava prazer. Essa falta de interesse se manifesta, inclusive, no modo de se vestir. A pessoa passa a usar roupa velha, suja ou deixa o cabelo e a barba crescerem.
Também é natural que tenhamos alterações de humor durante o dia. Você pode acordar mal humorado e melhorar com o passar do tempo. Quando essa mudança é muito extrema, porém, o sinal de alerta deve ser aceso. Geralmente, quem tem inclinações suicidas é tomado por uma tristeza profunda, procurando o isolamento e se sentindo sozinho, mesmo quando está cercado por outras pessoas. Além disso, exibe sinais de vergonha e experimenta crises de raiva.
É importante que a pessoa que está com esses pensamentos saiba que não está sozinha e que pode contar com seu auxílio para superar esse desafio. Demostre amor e empatia por ela, procurando entender o que está acontecendo, sem fazer qualquer tipo de julgamento. Quem tem tendências suicidas sente-se envergonhado ou culpado por se encontrar nesta situação. Esclareça que ela não precisa sentir culpa ou ter vergonha de estar assim.
Problemas emocionais podem ser tratados. Reitere que há outras pessoas preocupadas e que ela pode contar com o apoio de todas elas, mas também deve procurar ajuda de um profissional, como um psicanalista, psicólogo ou psiquiatra. Esse acompanhamento médico é importante para que ela veja que existem outras saídas para a situação que não o suicídio.
A melhor arma no combate ao sentimento de isolamento (um forte fator de risco) é o apoio emocional.
Enfim, não devemos ter medo de falar sobre o suicídio. Algumas culturas e famílias tratam o suicídio como um tabu, evitando falar sobre o assunto. Existe um medo de que isso pode instigar pensamentos suicidas.
Isso geralmente pode levar uma pessoa a nunca falar abertamente sobre a questão. Mas na verdade, ocorre o oposto; falar abertamente sobre suicídio pode fazer um suicida em potencial repensar suas escolhas. Acolha, demonstre apoio, tenha empatia e fique atento aos sinais que as pessoas podem nos emitir, demonstrando que algo está errado.
O equilíbrio emocional é fundamental para afastar qualquer tipo de pensamento ruim. Mas sabemos que para atingir esse equilíbrio uma série de fatores estão envolvidos. Não deixe para o dia seguinte, se você pode acolher, ouvir e ajudar uma pessoa em sofrimento. Muitas vezes, temos pessoas a nossa volta que estão sorrindo por fora, mas internamente, apresentam um psicológico abalado e fragilizado, e já não suportam mais a dor. Entendem que a melhor maneira de matar a dor é tirando sua vida. Uma solução definitiva para problemas temporários. Suicídio é coisa séria, não ignore os sinais. A melhor arma no combate a este mal é o apoio emocional.
Andréa Ladislau é psicanalista, doutora em psicanálise, psicopedagoga, palestrante, administradora, integrante da Academia Fluminense de Letras, colunista do site UOL e de outros veículos importantes do país.